A DESOBEDIÊNCIA QUE CAUSOU UMA TRAGÉDIA (Sylvio Macri)

A desobediência dos filhos de Eli à Palavra de Deus, somada à negligência de seu pai, provocou uma verdadeira tragédia familiar e nacional. Eli era sumo sacerdote israelita por volta do ano 1.000 A.C., época em que nasceu o profeta Samuel. Essa história foi narrada nos capítulos 2 a 4 de 1Samuel, e traz lições para nós hoje também.  

Quando o Senhor instituiu o sacerdócio, ainda durante a peregrinação israelita no deserto, escolheu Arão e sua família para essa função. Arão tinha quatro filhos – Nadabe, Abiu, Eleazar e Itamar – os quais foram consagrados ao sacerdócio juntamente com ele, mas os dois primeiros, por terem oferecido “fogo estranho diante do Senhor” morreram queimados pelo fogo que saiu do altar do Tabernáculo (Lv.10.1,2). Restaram apenas os dois últimos, dos quais descendeu toda a linhagem sacerdotal israelita, sendo um deles sempre o sumo sacerdote (1Cr.24.1-4). Eli e seus filhos eram descendentes de Itamar, o mais novo dos filhos de Arão que sobreviveram.

Nessa história há cinco aspectos a considerar.

1.       Um pai negligente

Eli falhou muito na educação dos filhos. Talvez por causa do encargo pesado de ter que atuar como juiz do povo durante quarenta anos, não soube dar a eles a devida formação nem foi capaz de impor-lhes limites. Os filhos de Eli, Hofni e Finéias, “eram ímpios e não conheciam o Senhor” (1Sm.2.12), mas apesar disso serviam junto com o pai no templo do Senhor, a Tenda do Tabernáculo, que nessa época estava em Siló. “O pecado destes jovens era muito grave à vista do Senhor, pois eles desprezavam a oferta do Senhor.” (1Sm.2.17).

Apesar disso, Eli não os puniu. Pelo contrário, em vez de destituí-los do ministério, advertiu-os brandamente. Por isso, Deus enviou-lhe um profeta, por meio do qual perguntou-lhe: “Por que honras teus filhos mais do que a mim, engordando-vos com o melhor de todas as ofertas do meu povo Israel?” (1Sm.2.29). E depois ainda falou-lhe por meio de Samuel, a quem o Senhor disse que iria punir Eli e sua família “pois ele sabia do pecado de seus filhos, que blasfemavam contra Deus, mas não os repreendeu.” (1Sm.3.13). 

Quando nossos filhos cometem pecados devem ser corrigidos e punidos. Porém, antes disso, é melhor ensinar-lhes a obedecer à Palavra de Deus e levá-los a conhecer o Senhor. Além disso, filhos devem ser ensinados a respeitar limites.

2.       O tríplice pecado dos filhos de Eli

O pecado dos filhos de Eli era o desrespeito à lei dos sacrifícios, tomando para si as melhores partes das carnes que eram oferecidas pelo povo, antes mesmo de serem cozidas ou queimadas (1Sm.2.13-17). Além disso, eles “se deitavam com as mulheres que ministravam à porta da tenda da revelação.” (1Sm.2.22). Mais tarde Eli também permitiu que Hofni e Finéias retirassem do santuário a Arca da Aliança, símbolo da presença de Deus, e a levassem para o campo de batalha na guerra contra os filisteus, como se fosse um talismã (1Sm.4.1b-11).

Dessa maneira, Hofni e Finéias cometiam um pecado triplo: em primeiro lugar, transgrediam a lei cerimonial, isto é, os mandamentos que estabeleciam como deveriam ser oferecidos os sacrifícios, que são registradas no livro de Levítico, capítulos 1 a7. Em segundo lugar, profanavam o santuário, a tenda da Revelação, onde Deus mostrava a sua glória, transformando-a em um antro de prostituição. Em terceiro lugar, impediam o povo de cultuar ao Senhor corretamente, por realizar sacrifícios incompletos. Quando algum ofertante protestava, era tratado com violência (!Sm.2.16).

Aqueles que estão na liderança do povo de Deus são responsáveis por viver uma vida de santidade e de compromisso com o ensino da Palavra de Deus.

 

3.       A tragédia anunciada

Houve diversos prenúncios da punição divina a Eli e seus filhos, aos quais ele não deu a devida atenção, e por isso o desastre atingiu não somente sua família, mas a todo o povo de Deus. Primeiramente, os comentários sobre os pecados de seus filhos se espalharam entre o povo de Deus, e o próprio Eli os avisou que um pecado cometido contra o Senhor não permitiria intercessão (1Sm.2.22-25). Em seguida, um homem de Deus foi até Eli, advertiu-o sobre o desprezo às coisas de Deus e comunicou-lhe que o Senhor retirara a promessa de que ele e sua família o serviriam para sempre. Disse também que Hofni e Finéias morreriam no mesmo dia (1Sm.2.27-36). Depois Deus usou o menino Samuel para dizer a Eli que estava prestes a enviar um castigo terrível sobre ele e seus filhos (1Sm.3.1-21).

Talvez porque estivesse tão velho que não alimentasse mais nenhuma esperança de mudar essa situação, em vez de tomar providências enérgicas, Eli respondeu a Samuel: “Ele é o Senhor, faça o que bem parecer aos seus olhos.” (1Sm.2.18). E nada fez.

O propósito da Palavra de Deus é não só apontar nosso pecado, mas levar-nos ao arrependimento e à mudança.

4.       O erro da autocomplacência e da autoindulgência

Autocomplacente é o sujeito que sente prazer em si mesmo, em suas próprias ações, mesmo que sejam erradas; autoindulgente é aquele que é tolerante para com seus próprios erros. Parece que os filhos de Eli tinham prazer em usar e abusar da posição de sacerdotes. Devido à velhice do pai, eram eles que atuavam de fato como sacerdotes, e achavam que nessa função podiam fazer o que quisessem sem prestar contas a ninguém.

Por causa disso, desrespeitavam os direitos daqueles que vinham ao Tabernáculo para oferecer sua adoração e não davam ouvidos quando recebiam alguma reclamação. Ao contrário, respondiam com violência. E também não deram ouvidos ao pai, quando este os aconselhou quanto ao seu comportamento. Certamente tomaram conhecimento da advertência divina por meio de Samuel, mas também não se importaram. Além disso, no episódio da ida da Arca ao campo de batalha não se incomodaram de cometer esse sacrilégio.

Quando a nossa vaidade pessoal nos leva a pensar que nada do que fazemos é errado, ainda que isso seja evidente para os outros, há muito pouco a ser feito em nosso favor. A punição divina já está a caminho.

5.       Punição e tragédia

A punição pelos pecados de Eli e sua família aconteceu de duas maneiras: a destruição quase total de uma família sacerdotal e a humilhação de uma nação inteira.

Cumprindo as profecias divinas, Eli, seus filhos e uma de suas noras, morreram todos no mesmo dia, quando Hofni e Finéias cometeram o pecado de retirar a Arca da Aliança do Tabernáculo e a levaram para o campo de batalha. Eles morreram ali mesmo; Eli e a mulher de Finéias morreram ao receber a notícia (1Sm.4.12-22). Mas ainda ficaram descendentes e parentes de Eli, os quais, mais à frente foram mortos por Saul. Nessa ocasião o Tabernáculo tinha sido transferido para Nobe, e o sumo sacerdote era Aimeleque, bisneto de Eli. Por achar que este tinha ajudado Davi a fugir, Saul mandou matar ele e todos os demais sacerdotes, em número de oitenta e cinco. Só escapou Abiatar (1Sm.22.6-23), que mais tarde tornou-se sumo-sacerdote, durante o reinado de Davi, mas foi destituído por Salomão, cumprindo-se a profecia do homem de Deus em Siló (1Sm.2.35,36 e 1Rs.2.27).

A tragédia também atingiu toda a nação quando os israelitas foram derrotados pelos filisteus, e estes tomaram a Arca da Aliança, símbolo da presença de Deus no meio do povo. Por isso, a mulher de Finéias, que morreu ao saber da notícia e enquanto dava à luz um menino, deu-lhe o nome de Icabode, que significa “Foi-se a glória de Israel” (1Sm.4.19-22).  Nossos pecados podem ter duras conseqüências que muitas se estenderão muito além do nosso círculo familiar. Entretanto, a história de Eli se salva pelo fato de ter acolhido no Tabernáculo e ensinado corretamente a Samuel, que, a seguir, se tornou o grande personagem da história de Israel.                 

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